A data de 8 de Março – escolhida a partir de 1921 para celebrar o Dia Internacional da Mulher e aprovada formalmente como tal, em 1975, pela ONU – esteve sempre ligada a corajosas lutas das mulheres pelos seus direitos e, em geral, pelos direitos dos trabalhadores.
Em 1908, cerca de 15 mil mulheres marcharam nas ruas de Nova Iorque, exigindo a redução dos horários de trabalho, o aumento dos seus salários com a respectiva equiparação aos dos homens e o reconhecimento do seu direito de voto, grande manifestação essa que se repetiu em 1909. Um ano depois, a Conferência Internacional das Mulheres Socialistas – realizada na Dinamarca e que reuniu mais de uma centena de representantes de 17 países diferentes – aprovou, sob proposta da militante marxista Clara Zetkin, uma resolução para a criação de uma data anual para a celebração da luta pelos direitos das mulheres. E logo em 1911 realizaram-se diversas manifestações na Dinamarca, na Áustria, na Alemanha e na Suíça. Em Nova Iorque, em 25 de Março desse mesmo ano, morreram 125 mulheres (praticamente todas jovens imigrantes) e 21 homens, horrivelmente queimados num terrível incêndio ocorrido na fábrica de camisas Triangle Shirtwaist Company, onde trabalhavam em péssimas condições de higiene e segurança e de onde não puderam escapar por estarem trancados no seu interior pelos respectivos patrões.
Em 8 de Março (já no calendário gregoriano) de 1917, na Rússia czarista, cerca de 90 mil operárias manifestaram-se, num protesto que ficou conhecido como “Pão e Paz”, contra o Czar Nicolau II, as péssimas condições de trabalho, os baixíssimos salários, a fome e a participação russa na guerra, o que levou, ao fim de 4 dias de dura luta, à abdicação do Czar.
Um século depois, em todo o Mundo, e também em Portugal, mantêm-se de pé as razões para se celebrar o 8 de Março como um símbolo da luta das mulheres pelos seus direitos e por um Mundo melhor.
No nosso país, e segundo os dados do Pordata, o fosso da desigualdade salarial entre mulheres e homens não apenas se manteve como se agravou durante a pandemia, tendo passado de 10,9% para 11,4% em 2020. A diferença salarial das trabalhadoras para os seus colegas do sexo masculino é de 130€ mensais no conjunto das remunerações mais baixas, de 230€ nas mais altas e atinge a escandalosa diferença de 1624€ por mês no sector da Banca e Seguros.
Ainda hoje, nas entrevistas de selecção e recrutamento de muitas empresas se pergunta a candidatas se elas tencionam engravidar, ter filhos e/ou assumir as responsabilidades e exercer os direitos da parentalidade.
Por força do preconceito ideológico que tende a desconsiderar as mulheres e a apresentá-las como meros objectos de prazer ou cuidadoras da casa e dos filhos, o essencial das tarefas domésticas recai quase exclusivamente sobre as mulheres (que trabalham assim duplamente, sucedendo ainda que, por cada 10 famílias monoparentais, em quase 9 o único adulto é a mulher! Simultaneamente, e com consequências absolutamente desastrosas para o País, desde logo a do seu marcado e crescente envelhecimento, as mulheres que exercem uma actividade profissional são, “a bem da carreira”, aconselhadas e pressionadas a não terem filhos ou a tê-los cada vez mais tarde, a ponto de a média da idade da primeira maternidade – que, em 2019, já foi de 31 anos – ter aumentado 4 anos desde o início deste século.
Segundo os dados da CIG – Comissão para a Igualdade de Género, em 2021 morreram 23 pessoas vítimas de violência doméstica, das quais 16 foram mulheres. No mesmo ano, e não obstante todos os constrangimentos decorrentes da pandemia e dos estados de emergência e de calamidade, as autoridades policiais portuguesas registaram 26.511 queixas de violência domestica. Isto, do mesmo passo que o preconceito ideológico já referido continua a caracterizar uma justiça criminal largamente contemporizadora e desculpabilizante para com os agressores. E, enfim, a nível mundial, um recente estudo da ONU Mulheres, elaborado com base na experiência de 13 países, evidenciou a estarrecedora realidade de que 45% das mulheres inquiridas relataram que elas próprias, ou uma mulher delas conhecida, sofrera alguma forma de violência durante a pandemia.
A luta pelos ideais e pelos objectivos que desde sempre marcaram a data do 8 de Março e a sua celebração permanecem, assim, mais actuais do que nunca!
António Garcia Pereira
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