A justiça não permite que José Sócrates dê entrevistas, soube-se hoje. A jurisprudência sobre esta matéria tem sido permitir as entrevistas (decisão já tomada pelo STA noutros casos), contrariando, à época, as decisões do MP e do Juiz de Instrução.
Esta decisão é reveladora que algo não está a funcionar bem com o nosso sistema judicial. Será que a prisão preventiva de um arguido lhe amputa os direitos de cidadania, mormente a liberdade de expressão?!
Estaremos perante uma nova forma direccionada de censura, impedindo os cidadãos de se defenderem e darem a sua versão dos factos de que são acusados?
Acho que vivemos no reino da hipocrisia. Se é suposto um arguido ser inocente, até ser condenado por uma sentença transitada em julgado, qual a razão para que não possa dar entrevistas?
Na verdade, quando se cerceia a liberdade de expressão de um arguido o que se está a transmitir é que ele é já culpado, e que tudo aquilo que possa dizer terá apenas como objectivo manipular a opinião pública contra um libelo de que a Justiça já tem certezas. Ou seja, esta decisão subentende que a Justiça já condenou Sócrates, que já não o trata como um presumível inocente mas como um indubitável culpado, e não admite ser contraditada.
Ora isto não é Justiça, é Inquisição.
A Lei é clara sobre as razões que podem determinar a prisão preventiva: continuação da actividade criminosa, perigo de fuga, perturbação das investigações. Ora, em que é que dar uma entrevista pode colidir com tais razões? Sócrates iria fugir no carro do jornalista?! Sócrates iria corromper o jornalista ou pedir-lhe dinheiro como é acusado de ter pedido ao seu amigo Carlos Silva?! Sócrates iria activar algum vírus maquiavélico que iria constipar o Juiz e o Procurador impedindo-os de prosseguirem a investigação?!
Não, nada disto é verosímil, e usando a expressão do advogado de Sócrates, trata-se, de facto, de um abuso.
Mas a maior hipocrisia é dos políticos, dos professores de direito, dos advogados e quejandos que vão manifestando as suas opiniões no espaço público.
Todos eles dizem que confiam na Justiça. Eu espanto-me. Como se pode confiar numa Justiça que não aceita ser contraditada na praça pública quando ela própria contribui para que dados dos processos sejam capa dos tablóides, originando as especulações mais perversas, verosímeis ou não, para gáudio dos mais vorazes, e servindo de arma de arremesso no combate político?
Não, eles também não confiam na Justiça que temos. E é por não confiarem nela que tem que ser hipócritas.
É que, também eles podem cair, um dia, nas malhas da Justiça que temos.
E sabem que, nesse dia, estarão tão indefesos como José Sócrates.
(*) Nota da Redacção: Estátua de Sal é pseudónimo dum professor universitário devidamente reconhecido pelo Noticias Online.
Esta notícia constitui uma machada mortal na lisura de processos do Ministério Público quanto a J. Sócrates. Em vez de ter dado seguimento à disponibilidade do visado para ser ouvido, o MP preferiu detê-lo para interrogatório, não fossem as televisões já contratadas perderem o espetáculo live.
É evidente que a sonegação da disponibilidade de Sócrates para prestar declarações só pode ter sido propositada, para submetê-lo à humilhação pública da detenção, o que constitui uma notória instrumentalização desta, que afinal era desnecessária, deitando também por terra o argumento do “perigo de fuga” como justificação da prisão preventiva com que foi depois “agraciado”.
Até agora, tudo indica que os “milhões de Sócrates” não passam de ficção resultante de excesso de imaginação policial. Mas os enormes danos materiais e morais causados pelo abuso de poder do Ministério Público bem podem no final proporcionar-lhe uns milhões de indemnização do Estado!
http://viriatoapedrada.blogspot.pt/2014/07/a-maior-cabala-e-mentira-depois-de-74.html
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