No meu quarto do hospital, vou assistindo ao grande festival que a comunicação social vem desenvolvendo à volta do caso do “assalto” mais famoso na nossa comunidade.
A “oportuna” difusão da acusação do Ministério Público, em plena campanha eleitoral, “caiu que nem sopa no mel” no prato dos partidos da direita e é um “fartar vilanagem “…
Confesso que me sinto escandalizado, enojado. Assistir a este espectáculo despudorado, onde os “responsáveis” pelo desencadear da operação “furto de material de guerra” continuam a actuar como se lhe fossem alheios, explorando até ao tutano, de forma despudorada, as consequências de um acto de enorme gravidade que eles próprios provocaram.
Para compreender a minha teoria, basta regressar à época e lembrar que, na sequência da profecia/declaração de Passos Coelho de “vem aí o Diabo”, os incêndios que então se verificaram foram explorados, de uma forma descabelada, num violento ataque ao Governo, como se nunca tivesse havido incêndios em Portugal e o executivo fosse o autor dos mesmos.
Mas, como esse ataque não estava a resultar como a direita pretendia, havia que criar uma nova justificação para enfrentar a teimosia do Diabo. Do tipo, quer queira ou não queira, o Diabo tem de aparecer.
Aqui, concordo com a leitura do meu camarada Carlos Matos Gomes, que classifica esta operação como uma Operação de Falsa Bandeira! E eu falo com conhecimento de causa, pois na Guerra Colonial também participei numa dessas operações mistificadoras…
Nesse contexto é interessante assistir à proclamação de um deputado europeu do PSD, “a questão criminal nem é o que mais interessa! A questão fundamental que está em causa é a questão política!”
Pois é, por razões políticas, cria-se um facto de repercussão retumbante, aproveita-se a inabilidade dos responsáveis políticos e militares – alguns mostraram perfeitamente as suas incapacidades – e, usando a ausência de pudor e vergonha, explora-se o acontecimento como se os “assaltantes” dos paióis fossem o ministro da Defesa e o próprio Governo!
De tudo isso resulta que o que passou a ser importante é a maneira como se recuperou o material furtado e não a maneira como esse material foi desviado dos paióis, onde se devem incluir as motivações e as cumplicidades.
Vou levantar algumas questões, fazer algumas perguntas.
Começo por perguntar se a própria PJ está convencida de que o destino do material seria a ETA ou qualquer outra organização terrorista? Basta atentar na qualidade do material furtado! Para além de sabermos que essas organizações não têm dificuldade em obter o material de que necessitam, sou de opinião de que essa hipótese incluída na acusação só serve para justificar a decisão da PGR, que decidiu retirar a investigação à PJM e entregá-la à PJ. Com as consequências que sabemos isso ter provocado nas más relações entre as duas polícias. Foi como deitar gasolina no fogo…
Pergunto, se a intenção era a de vender o material a qualquer uma organização, terrorista ou não, porquê a não concretização dessa venda? Não me venham com o argumento de que os ladrões se assustaram com o barulho feito à volta do “assalto” e se apressaram a querer devolver o material roubado! Como se costuma dizer noutras ocasiões, “essa só contaram para você”…
Em minha opinião, isso verificou-se porque tendo o furto sido encomendado, o presumível comprador nunca apareceu! E não apareceu porque nunca existiu! Pois se a intenção foi criar um facto político…
Descubra-se o mandante e compreender-se-á melhor todo o processo do “achamento” e da recuperação do material… E, ou o autor do furto foi bem comprado para não revelar quem lhe encomendou o mesmo, ou não compreendo o seu silêncio!…
Sobre a questão do conhecimento da operação de resgate do material, da parte do MDN, é importante saber como o caso lhe terá sido transmitido. Será que lhe foi dito que, através de um informador, era possível recuperar o material? Ainda que tivesse que se privilegiar a recuperação à prisão dos ladrões. Se assim foi, gostava de saber qual é a Polícia que não usa informadores e não negoceia com eles contra-partidas! Confesso que no lugar do MDN, se de facto foi isso que se passou, teria felicitado a PJM pelo trabalho desenvolvido e pelos resultados alcançados!
Afinal, o que interessava mais, naquele momento e naquelas condições? Recuperar o material, mesmo que se perdesse a oportunidade de prender os autores do furto, ou perder uma e outra dessas oportunidades? Atente-se no facto de muitos defenderem o apoio aos prevaricadores arrependidos que ajudem as Polícias a deslindar os crimes cometidos!…
A recuperação do material interessava ao Governo?
É tão evidente essa afirmação que a considero uma autêntica “verdade de La Palisse”!
Por isso, mais estranho se apresenta, o que leva a desconfiar (é o gato escondido com o rabo de fora), essa afirmação estar na acusação que o MP acabou de difundir… Sejamos claros, numa acusação não podem caber análises de natureza política! A acusação deve limitar-se à compilação dos dados recolhidos, dados que só ao Tribunal cabe analisar e sobre eles tomar decisões!
Pois é, o MP põe-se a jeito, não se surpreenda se se vir acusado de cabalas ou coisas semelhantes!…
Há um mistério que ainda ninguém esclareceu: havendo duas redes de proteção dos paióis, tendo sido abertos buracos apenas na rede exterior, como passaram os “assaltantes” pela outra rede?
As eleições estão à porta, a “festa” vai continuar, confio que o eleitorado se não deixe enganar…
Lisboa, 28 de Setembro de 2019
Vasco Lourenço
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