Tentaram nos enterrar mas não sabiam que éramos sementes.
Alugo um período do tempo da minha vida diária.
Se não peço valores reais pelo serviço, não é por não saber o valor real do meu trabalho, mas porque esse valor é suficiente para o que preciso.
De pouco preciso.
Preciso do suficiente para a cabeça estar fora da água a respirar
e sorrir a boiar, sabendo que tenho pé e não me vou afundar.
Mas não me vendo. Por preço nenhum.
Aconteceu-me mais uma vez neste novo mundo de trabalho esclavagista de ordenado mínimo, mas sem o mínimo de garantia de respeito pela vida de quem trabalha. De subordinação a autoridades externas que julgam ter legitimidade, para mandar na vida de quem lhes aluga o seu tempo diário de vida, mas se recusa a deixá-los ultrapassar limites.
As mulheres sempre foram seres subordinados e subjugados a quem se julgava autoridade sobre elas. Antes de terem direito a voto, em Portugal no Estado Novo por exemplo ou para com os maridos também.
Voltámos ao Estado Novo só que agora votamos mas de nada serve.
É assim que acontece na violência doméstica. Os escravos recebiam o mesmo tratamento. Seres subordinados e subjugados por gente que se julga autoridade sobre as suas vidas.
E é hoje no mundo do trabalho. Qualquer trabalho em qualquer área, idade, género ou credo.
Subordinados a quem de forma totalitária e unilateralmente se julga dono das nossas vidas.
O governante, o patrão, a empresa de recursos humanos, o chefe/chulo hediondo e fútil que julga ter o pequeno poder de controlar /oprimir/ dominar as pessoas que para si trabalham.
Esse é o objectivo. Ter pessoas vazias de consciência, de emoções, de voz.
E se alguma reclama ainda que seja em voz baixa, pressionam, demitem e não pagam.
Acho que foi Deus (ainda não está provado sem margem para dúvida) que ao criar o mundo, sentado no paraíso a imaginar a sua Eva e o seu Adão, fez um círculo à sua volta para perceber os limites da criação (li isto por aí).
A caixa craniana limitaria o centro nevrálgico onde os neurónios fazem o seu trabalho, a pele limitaria o palco onde a máquina faz funcionar todo o sistema, como a casa do casal se limitaria pelas paredes e por aí fora. O ambiente seria limitado pela atmosfera na esfera que limita a terra.
Como na vida social e do trabalho os limites são parte de todos os sistemas, ou não teria havido revoluções para a evolução do grilhão até ao ordenado mínimo, e, chegar aos dias de hoje onde já se discute, reivindica e aplica-se (no Utrecht-Holanda por exemplo) o rendimento básico garantido como forma de assegurar as condições dignas de vida para qualquer pessoa para que esta possa fazer o que entender com a sua vida no que diz respeito ao trabalho.
O trabalho deverá ser uma escolha, uma paixão, um acto de dar de o melhor de si e não de opressão/domínio ou de sobrevivência. E deverá ter limites claros. Foi isso que nos chegou com os contratos colectivos de trabalho e a legislação laboral moderna alcançada pelas lutas de homens e mulheres que como nós não se deixaram subjugar e escravizar.
Claro que não somos livres hoje e o mundo do trabalho é de novo um mundo de controlo,domínio, opressão e abusos. De subordinação de pessoas, onde pessoas se julgam sem limites ao lidar com outras pessoas.
Só não o é hoje pela força do chicote antes sim pela força do dinheiro.
É o reino divinal do “venha a nós”. Dos patrões que nem falham a missa aos domingos e amam padres. Veja-se o Santo Espírito do Espírito Santo entre a maioria das famílias portuguesas capitalistas que se julgam “donas dos trabalhadores”.
Eu mando, eu posso, e tu se não quiseres obedecer outros mil hão-de aceitar (porque ó Evaristo, desempregados há muitos…). Esta gente arroga-se (como quem toma por garantido) que os trabalhadores são ilimitadamente prostitutas escravas, robotizadas e sem actividade neuronal.
Controladas e emocionalmente vazias. Fúteis, superficiais, passivas, obedientes, consumidores distraídos por valores fúteis e inúteis. Nós as prostitutas deles.
Por azar dos chulos nem todas as putas se vendem. Algumas há que fazem um círculo à sua volta. São elas que escolhem como querem ser comidas.
No meu caso ficam a saber que sexo só com orgasmo e uso do preservativo.
São os limites impostos no meu trabalho para quem pensa em abusar. No dia que pisam a linha limitadora, eu prostituta, rebento o trabalho (blow the job).
E se me apetecer, eu prostituta sem vergonha e digna, chamarei os nomes dos bois abusadores, esses sim com razões para se envergonharem.
Nunca contem comigo para pactuar com o jogo da obediência e do silêncio.
Antes morrer de fome que morrer curvando-me subjugada para receber uma malga de sopa.
Ando muito contente por saber que por cada caso de opressão e abuso, uma ou duas sementes aparecem a denunciar situações, a não calar. Como em todas as situações que nos oprimem e subjugam.
Estes são tempos de solidariedade e de juntar esforços contra a nova escravatura orquestrada para nos silenciar.
Não posso aceitar a subjugação nem a opressão de outrem.
Chegámos aqui ao estado de domínio cuidadosamente programado, mas lentamente vejo mudanças irreversíveis na consciência colectiva.
Já somos muitos a lutar pela não aceitação destas regras.
A minha curta vida não é uma amarra, é uma escolha em nome da liberdade.
A vida é para ser usada como primavera das sementes.
Já despontamos. É minha fé que despontaremos sem limites.
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