Carta aos Queridos Banqueiros

Queridos Banqueiros,

Espero que esta vos encontre bem, eu cá vou indo, na graça de Deus.

Fiquei muito preocupado ao ver a forma como o sr. José Manuel, Joe para os amigos, foi tratado por aqueles indivíduos que, sendo despudoradamente eleitos pelo povinho, pensam que podem questionar, duvidar, interrogar o sr. José.

O Sr. José é um cidadão exemplar que luta todos os dias para pôr gasolina do depósito do seu Maybach, sim aquela coisa consome que se desunha e o raio do motorista não sabe conduzir em modo económico. Ainda por cima todos sabemos que o sr. José não tem grandes posses, pernoita numa casa modesta, desconfio que por favor porque quando lhe perguntavam quanto pagava de renda o coitado meio acabrunhado e com um sorriso parvo respondeu “não sei bem, qualquer coisa, não sei”. Este é claramente mais um daqueles casos que infelizmente assolam o país de pobreza envergonhada, o sr. José teve vergonha de admitir perante os deputados que, devido às suas dificuldades financeiras, pernoitava por favor numa casa emprestada. Já o ex-primeiro ministro não, outra geração, não tem qualquer pudor em admitir que tem muitas dificuldades e que tudo o que faz é com a ajuda dos amigos que tudo lhe emprestam sem olhar a meios para o apoiar nos momentos difíceis.

Ora o sr. José, o Joe para os amigos, para não confundirmos com outro José, é um cidadão empenhado, sempre pronto e disponível para ajudar quem lhe pede ajuda e os senhores banqueiros sabem isso. Sabendo isso abusaram da sua disponibilidade e boa vontade para lhe empurrarem goela abaixo quase mil milhões de euros que ele não queria mas, os senhores banqueiros, por artes e manhas que tão bem dominam lá o convenceram que estavam com um grave problema de excesso de liquidez, que isso era muito mau, corriam graves risco de ficarem empanturrados e lá convenceram o sr. José a vos ajudar livrando-vos dessa liquidez excessiva. 

Estou convencido que inicialmente, quando abordaram o sr. José, ele ficou convencido que esse excesso de liquidez era excesso de tintol como aquele que ele tem lá na Quinta da Bacalhoa, perdão como um amigo dele tem lá na quinta a que ele, uma vez mais, faz o favor de dar a cara como se sua fosse mas não é.

Acho sinceramente que o Sr. José já não tem idade para andar nestes apertos, com gente como estes deputados a fazerem perguntas inconvenientes e com os jornalistas a dizerem que ele coitado deu um calote aos bancos. Os senhores banqueiros sabem que assim não é.

Foi deprimente ver como uma pessoa com aquela idade, sem nada de seu foi tratado naquela comissão de inquérito, nem no tempo da inquisição assim se tratavam os objectos dos autos de fé. O sr. José estava tão atrapalhado com estas coisas que teve de ser um outro senhor com uns óculos muito coloridos a ler por ele aquilo que ele não sabia que queria dizer e a dar-lhe pancadinhas no braço quando o sr. José, como quase todas as pessoas com alguma idade, começava a falar de mais.

Eu sei que os senhores banqueiros são pessoas de bem e que não mais vão querer sujeitar o sr. José as estas coisas e, por isso mesmo, como bom cidadão e português venho humildemente oferecer-me para, quando os senhores banqueiros acharem que estão com excesso de liquidez, vos ajudar. Não se preocupem que eu aguento, sei ler uma declaração inicial, sei responder a perguntas sem me partir todo a rir com os disparates que estou a dizer e, tão o mais importante, nem sequer uma garagem tenho em meu nome portanto por aí não vai haver problema.

Quanto a arte, se acharem que é necessário, sei que há por aí coisas interessantes e muito famosas, como um urinol virado ao contrário a que chamam “Fonte Invertida”, em Serralves esteve em exposição, até que um papalvo dum camone se esbandalhou lá dentro um buraco no chão a que davam o pomposo nome de “Buraco no Chão” e há por aí uma coisas feitas com tachos e napperons que também dizem ser arte. Ora, se acharem conveniente passo numa loja de artigos de construção e numa loja de artigos para o lar e compro umas sanitas, uns urinóis, uns tachos e umas panelas e faz um museu. Penso não ser importante se tem valor ou não porque os senhores banqueiros não estão interessados, é só para fingir que há uma garantia.

Espero que tenham em consideração o que vos propus e que não macem mais o sr. José com os vossos problemas de liquidez, macem-me a mim que sou mais novo e ainda tenho disponibilidade para essas maçadas.

Agora despeço-me, com elevada estima e consideração, desejando que não sofram muito com esses problemas de liquidez, mas se, os tiverem, se Deus quiser cá estamos para tratar deles.

Jacinto Furtado

P S : Era para vos enviar junto a esta carta os títulos duma fundação que não existe mas que tenho em mente fazer um dia para ficarem já como eles como garantia, na certeza de que de nada vos servem, mas quando me lembrei já tinha fechado a carta. Fica para a próxima!

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