“Dediquei-me de alma e coração a Portugal”

“Dediquei-me de alma e coração a Portugal”. António Costa, PM de Portugal

Desculpa-me Vovó Xica, eu cidadã contribuinte votante, vou falar política. Portugal é uma espécie de restaurante à la carte com buffet. Pode-se pedir o prato que se quiser, e em simultâneo servir-se à vontade. Muitos países têm comida. Nós temos gastronomia.

Espero sinceramente que António Costa – a mulher de César não basta parecer, tem de ser séria – seja considerado inocente até prova provada em contrário como diz a lei. E eu acredito na Lei. Qualquer suspeição e acusação formal ao ex -PM de Portugal tem de ser devidamente investigada, os factos apurados e todos os procedimentos legais transparentes, perante quem paga a factura. Tem o direito de ser inocente até ao final do processo. Papagueio o que dizem por aí. 

Se foi um “desbloqueador” de negócios, nós, os contribuintes, temos o direito de ver os recibos sobre: quem, como, onde, porquê, o quê.

Mas isto é wishful thinking…só nas novelas e na literatura é que no final sabemos as respostas. Não neste restaurante com porta aberta para a cozinha mas que opera com vidros fumados. Chamam-lhe com graça e sem ironia – democracia e Estado de Direito. Riem-se nas costas. 

Na política, desgraçadamente em Portugal, o cobertor que os afaga (aos políticos) também os esconde. Na política no meu país encostado às cordas do mar, ninguém a ele se dedica de alma e coração. Esse é o fado triste desta nação. Rio-me eu, alto. 

Dos Reis aos Republicanos, passando por Maçons e os dedicados a Deus, das Cruzadas às invasões, às quais chamaram “descobrimentos”, da colonização à ditadura, às ligações com a Igreja Católica, à Santa Casa da Misericórdia, “Valhamedeus – Misericórdia”, quem se senta nas cadeiras do poder tem uma preocupação – desbloquear negócios sejam eles sobre dinheiro, prostituição, privatizações de sectores cruciais da economia, pedofilia ou qualquer outro.

O Primeiro Ministro não é suposto ser a figura da boa governação, transparente e leal em nome do povo de Portugal, mas desbloqueador (que palavra bonita e cheia de arte). Se tiver pretensão e genuinamente quiser ser o que deve ser, será torpedeado pelos meandros da política dentro dos partidos, os fiéis da democracia. Só que não o são. 

O Primeiro Ministro rodeia-se de amigos do peito, não de gente que por mérito, ética e moral inatacável sintam dedicação pelo país e a ele se ofereçam de alma e coração. E, se meterem a argola no pé, recebem por parte do PM uma argola no pulso. 

Não, não funciona assim.

Um PM é um desbloqueador, não de procedimentos burocráticos que servem a vida pública mas que são aprazíveis aos negócios privados. Um PM não tem de perder tempo em ouvir o seu povo, representado na Assembleia da República, porque os partidos estão afinal dominados por “lobbies” de negócios, mascarados de interesses dos cidadãos. Ainda por cima já não conseguem esconder nem enganar todos ao mesmo tempo. Este é o pecado. Aqui nasce o desligamento dos cidadãos da política. 

Portugal sempre foi um caldo onde se congeminaram sacadas e golpes. O pote Luso serve para destilar os vapores da arrogância uma vez chegado ao poder. Os políticos estão investidos no complexo de “Rei Sol” – eu sou o poder, o poder sou eu quando tocam no altar. 

Fazem-no em alternância – como as melhores putas do Conde Barão. Tenho o maior respeito por essas putas. Sabemos o que fazem sem opacidade. Enquanto que na política fia mais fino, entra a finesse do colarinho branco e o botão de punho de ouro. Das cunhas às cavilhas, da rede de amigos, o que interessa é desbloquear, não o amor a Portugal mas o amor pelos próprios negócios. Comovente. 

É quanto basta para que a extrema direita se aproveite do descontentamento, se finja séria, diga o que queremos ouvir, comendo-nos a todos, sem sequer aquecer o prato. Faz exactamente como alguém que só quer sexo e se depara com alguém que precisa ouvir primeiro juras de amor eterno antes de se oferecer por inteiro. O tuga gosta de ouvir juras destas. Ou mais de uma dezena de assentos não estariam preenchidos por gente vulgar e matreira. 

Mas então e se os outros não são melhores e é precisamente por causa de comportamentos irresponsáveis que isso acontece? 

Não admira a justiça ser lenta. Pior, não admira que não se faça. Pior ainda – cede a chantagens e a jogos de poder. É  “justa” para quem pode pagar bem colarinhos brancos e botões de punho. São tantos os casos que sinto vergonha alheia. Pelo País.

As hienas ficam à espreita. Estes são comportamentos indutores de promessas e juras de amor falsas. Parece que a Justiça não foi saneada pós ditadura. Nem as demais Instituições. 

Não há separação de poderes nem confiança nas Instituições. Por essa razão, não admira que cada dia que passa, o tal Povo de Portugal que vota e paga, os que não votam e pagam todas as facturas, se dissociam desta forma de fazer política. 

O Povo além de pobre, inculto, pequeno, invejoso e com pouco mundo, também é esperto. Sabe que faça o que fizer, nas suas costas, alguém irá desbloquear um golpe para favorecer um negócio, alguém, ou uma Instituição. Sabem que se alguém quiser destituir alguém, também é possível. Basta pedir. Está no menu do restaurante.

Eu sou apenas uma cidadã preta e branca com uma opinião, cujo passado de mentiras deste meu país me assola à garganta constantemente, como no caso das invasões e consequente colonialismo e Escravatura, cuja factura nunca reconheceu muito menos pagou. Falo assim, porque quanto mais pobre, destituído de dignidade económica e liberdade um povo se vê, mais atira culpas sobre os mais frágeis, vulneráveis e pobres e nunca sobre quem os arruina e faz promessas de amor falso. 

Imaginem Portugueses – com o passado ligado ao roubo e exploração nas suas ricas ex-colónias no Brasil, África e Ásia, se não são ricos hoje, mas mesmo muito ricos, cada um dos dez milhões de Portugueses e em seu lugar tem uma Nação a viver de mão estendida (agora à Europa), a quem se deve? Acertaram – aos governantes desbloqueadores que servem e se dedicam a Portugal com a alma e o coração. Com a agravante de não prestarem contas verdadeiras e transparentes. 

Como artista das histórias que sou, deixo a sinopse de um guião num único parágrafo. O tal que basta para contar uma história. 

Uma tragicomédia burlesca ou operetta bufa que se desenrola num tabuleiro de xadrez, num circo romano, ou dentro de um carro de alta cilindrada com vidros fumados onde decorre a acção; entre orgias, golpes palacianos, ligações perigosas, caldos marinados nas costas, facas longas afiadas nas portas, segredos de alcovas, almoços e jantares bem regados e mal pagos, casos e casinhos, corruptores e corrompidos, pactos e juras de amor ao poder, arrogância encaixada na ganância por poder e cobres, caixas de pandora abertas e segredos de polichinelo segredados nos corredores, chegou o dia em que um parágrafo de um dos poderes da República, o da justiça de procuradores, num pequeno estado de direito democrático se desbloqueou para fazer cair uma maioria governamental, dada a um partido que um dia se disse socialista, co-fundador de uma pseudo-democracia, com quarenta e nove anos, pós queda de uma dura e pesada cadeira de quarenta e um anos, dando tempo suficiente aos partido dela paridos, de se envolverem num polvo com tentáculos para negócios, redes de interesses e partilhas, tráfico de influências várias, mesquinhas, pequenas, lavagem de mãos e notas, propaganda e mentiras, escrever promessas em papel molhado, tecer uma teia de interesses, jogos, golpes, contra-golpes e servicinhos, amiguismos e protecções pífias, falências obscuras, privatizações de última hora, quase na hora do fecho dos governos caídos em desgraça com e sem d, em sectores chave da república laica e democrática, num jogo de magia, espelhos e sombras, toda a trama nas costas, à custa do seu povo, tão pobre e desacreditado de todas as papas de tolos que lhe querem empurrar pela goela, povo que não merece tantas vinganças frias, fazendo com que tanta gente de boa estirpe queira viver afastada da mui nobre política, atirada que foi para um enorme lodaçal, num imenso carrossel de voltas e reviravoltas.

É este afinal um argumento sem graça e nada original. Nada a que o mundo nunca tenha assistido.

É minha obrigação fazer de conta que acredito na Lei, na Democracia, no bom carácter de políticos, legisladores e que os responsáveis sejam responsáveis, exemplares na ética e na moral. Contudo, como se diz em Inglês “it is unlikely”, porque a história do passado serve-me de guia para o dia de hoje e de amanhã. Acredito na lei, mas não meto a mão no fogo por ninguém. 

No meu também país, as montanhas têm tendência a parir ratos dedicados de alma e coração. Que infelizmente desgovernam com alma e coração, desaparecem, nunca se responsabilizam e saem do restaurante sem pagar a conta dos almoços. Como os não há grátis, pagam os zés. 

Eça, Dostoievski, Pushkin, Becket, Shakespeare, Dumas escreviam baseado em factos surreais da realidade. 

Siga o circo, o futebol e o fado. Desta vez vou votar com alma e coração no partido que me prometer apenas sexo sem juras de amor. Sei que à direita – demasiado púdicos, fingidores e manipuladores, tal é impossível. 

Anabela Ferreira

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