Em democracia eles são os que nós escolhemos e aquilo que nós permitirmos que eles sejam. (por Dino Barbosa)

Aos debates televisivos de hoje são chamados “senhoras” e “senhores” que propõe a “debater” “ideias”, pretensão desesperada, porque o mais das vezes, nunca nenhuma lhes passou pelas cabeças. Quando os intervenientes são políticos, o putativo debate costuma cingir-se à polémica sobre quem tem o direito de interromper quem, e lá de vez em quando, sobra algum tempo para discutir (vagamente) os méritos e deméritos desta ou daquela medida deste ou dacoloutro governo. E de debate em debate chego à conclusão que o melhor que vi, foi há dias, no canal “A Bola TV”, em que foram discutidas (mesmo assim vagamente) as causas para a violência, no desporto, mas não só, a que hoje assistimos em crescente. Foi positivo ali ver reconhecida a incapacidade  dos pais, neste país, para compreender algo tão primário quanto a importância da educação física na formação moral e cívica. Mas foi já um bom começo assumirmos os nossos erros pessoais e colectivos.

Talvez seja “isto” mais fruto do que nós somos, do que propriamente do que eles são. Até porque em democracia, sendo eles os que nós escolhemos, serão também aquilo que nós permitirmos que eles sejam (não me canso de o dizer, mesmo que vozes de burro não cheguem aos céus). A verdade é que, em democracia, passámos a rever-nos, não no político impoluto, não no candidato bem preparado, mas antes naquele que conseguir expelir a maior bazófia. «Primeiro a notabilidade, depois a notoriedade».

transferir (1)E “isto” tem uma explicação: há trinta anos atrás, a esmagadora maioria dos políticos (nos partidos de direita, mas também à esquerda e principalmente no PS; ou até o próprio Carvalhas, no PCP, em 1992) tinham fortuna pessoal, proveniente geralmente de rendimentos de capital ou rendas de prédios rústicos. Ou seja, tinham os meios financeiros para dispor do tempo para se dedicar à Nação. Não faziam cornos, nem chamavam “filho da puta” ao “cavalheiro” da outra bancada. Deixou de ser, assim precisamente, a partir da invenção do “Homo Cavaquensis”: o cidadão deixou de ser político, para ser o político a tratar de ser cidadão. Servindo-se do Estado, em vez de o servir. E eis que aparecem nos partidos de direita muita gente que militava na extrema-esquerda: o inefável Durão Barroso é o melhor exemplo, mas Nuno Crato também serve. Ou Jorge Coelho. Ou o próprio Paulo Portas que um dia se declarou um “anarquista” que deixaria de falar ao seu melhor amigo se ele entrasse para a política… Enfim, nuances ligeiras. Mas sempre a mesma “evolução” (como alguém lhe chamou).

Assimpassos-coelho_cavaco-silva_relvas_marcelo-rebelo-sousa foi:  Ou para nossa miséria, assim foi sendo. Passos Coelho, por exemplo, era o líder da JSD quanto o dito Cavaco era primeiro-ministro. O próprio Guterres: um engenheiro electrotécnico presidente da Assembleia Municipal do Fundão (já depois de uma efémera carreira académica em que ministrou vagas aulas da disciplina de Teoria de Sistemas e Sinais de Telecomunicações), que foi subitamente eleito primeiro-ministro de Portugal (!!!). E foi precisamente no período guterrista que assistimos a ascensões fuminantes em carreiras (políticas; e não só…) impulsionadas pelo equivalente universitário das “novas oportunidades”, inventado por um engenheiro mecânico alçado a ministro da educação (e subsequentemente, por despudorada ironia, administrador da Fundação Calouste Gulbenkian…), o cintilante Marçal Grilo. A licenciatura do Relvas, feita à custa dessa “busca permanente de conhecimento”, não fica em nada atrás da licenciatura da generalidade dos políticos que são filhos legítimos ou bastardos deste negrume pantanoso da história de Portugal, que intermeia entre o Cavaquismo e o Guterrismo.

Vimagesoltemos ao senhor de Boliqueime. Que um dia disse que todos os que o criticavam, eram «homens azedos e frustrados que escrevem mal de tudo se calhar porque têm problemas em casa». Ele, Aníbal, Cavaco Silva para os amigos (Dias Loureiro, Oliveira e Costa, Duarte Lima, e outros), apresentava-se aos aborígenes como um Dom Sebastião (não deixando de ser curiosa a comparação do discurso de ontem ao discurso de hoje de António Costa…), possuidor da receita que criaria “um novo homem português” e um Portugal que sairia para sempre da «cauda da europa», fruto da gloriosa «modernização» e da «concertação social», pela qual «nunca mais apertaremos o cinto». E foi o que foi, embora houvesse quem avisasse. Havia, assim, que encomendar símbolos para o regime: a Expo98 e o Centro Cultural de Belém. Basta atender às expressões citadas para perceber que nunca passámos daqui. Em 1992, Cavaco Silva, primeiro-ministro, presidia ao Conselho de Ministros da CEE no Centro Cultural de Belém, ingorando que no ano anterior os juros da dívida pública tinham absorvido 8.5% do PIB (curiosidade: em 2011, a ultrapassagem não ultrapassava os 5%). Os quatro anos anteriores tinham sido desastrosos para a produtividade portuguesa. Mas havia quem lucrasse com isso.

Mau tempo em LisboaE nós, permitimos. Para mal dos nossos pecados, permitimos. Permitimos que o Edil António Costa dissesse que a culpa das cheias na Praça de Espanha era da maré cheia no Tejo, e permitimos que ele dissesse que «não se pode lutar contra São Pedro». Pouco ou nada aprendemos com o caso da Vivenda do Algarve: na Av. da Liberdade há caso análogo. E ao BPN seguiu-se o BES. Até o discurso é igual: “deixem-nos trabalhar”, dizia Cavaco. E nos deixámos. E continuamos a deixá-los “trabalhar”…

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