Entrevistas, Estratégias … e a Verdade! (por João de Sousa)

a-melhor-do-filmeEsta semana, na segunda-feira, 7 de Dezembro de 2015, gravou-se aqui em “Ébola” a entrevista ao Inspector João de Sousa.

A CMTV fez deslocar dois elementos – um operador de câmara e um jornalista. O Director do Estabelecimento Prisional colocou um guarda a ver e ouvir a entrevista (a sua presença era notória pelo “canto do olho” de entrevistado e entrevistador). Também foi colocado um pano ou uma toalha, não consigo precisar, a cobrir a porta vidrada existente na sala de visitas, local onde decorreu o evento. Objectivo? Não se filmar o espaço para lá da porta! O que existe do outro lado da porta? Um guarda sentado numa cadeira e um pórtico detector de metais! Então porque o fizeram? Podiam dar indicações para não “apontar a câmara” para o local! Eu sei lá, mas arrancou-me uma boa gargalhada quando vi o medievo e boçal aparato.

Nervoso, muito nervoso, quando fui conduzido à presença dos profissionais da CMTV, cometi uma gafe comprometedora:

– Bom dia! – saudaram ambos em uníssono.

– Bom dia! Inspector João de Sousa, corrupção! – Ups! Que tropeção! O que eu queria dizer era: “Bom dia! Como estão!” Que “borrada”!

Sempre que me apresento, profissionalmente, invariavelmente digo: “Bom dia/tarde/noite (conforme a hora do dia) Inspector João de Sousa, homicídios!” Desta vez saiu-me “corrupção”!!!

De imediato pedi desculpa, justificando-me com os nervos que experimentava, acrescentando que o aforismo popular “fugiu-lhe a boca para a verdade”, nem sempre se aplica!

Tanta preocupação com tudo – a imagem, o que iriam perguntar, como iria responder, como sentar-me, o que levar nas mãos – e um engano constrangedor logo aquando da saudação!

Um dos aspectos que mais me preocupou na entrevista, Caro(a) Leitor(a), foi a imagem, ou seja, como deveria apresentar-me ao “mundo” 1 ano e 9 meses depois?

Com a roupa que visto aqui diariamente – fato de treino e ténis – qual jovem delinquente em reclusão? Barba por desfazer, o que apela para a terrível privação que estou a experimentar? O “coitadinho” que sofre, o humilde “Zé Maria” do “Big Brother”, vítima do sistema? E o fato de treino, deveria mandar lavar ou vestir um sujo?

Ténis, os de treino, sujos, ou os “de andar”, ou mesmo chinelos?

“Reforço vicariante”. Sabe o meu Leitor(a) o que é?

Dizem os teóricos da aprendizagem social que se trata de uma forma de reforço que se verifica quando alguém observa um modelo que é recompensado ou punido.

Quem é que aqui não tomava banho, cheirava mal, só tinha um fato de treino, umas calças de ganga e umas botas rotas que não permitia que as tirassem, e que agora está livre como uma “ave do paraíso”?

Pois é, o José Sócrates! Logo, se com ele, que foi considerado um dos mais elegantes líderes políticos europeus, resultou a vitimização, a falta de higiene, o “coitadinho” que quando chega à Abade Faria, 33, está todo roto com uma t-shirt com odor intenso, deslavada; então a solução é a imagem do Conde de Monte Cristo antes da fuga e posterior riqueza.

Fato “desenhado à medida”, lenço na lapela, gravata italiana, postura digna, vaidade visível, discurso orgulhoso, “senhor de si mesmo”, nada disso; isso seria um erro: “vejam o “tipo do ouro” da P.J.”, “olha o aspecto, aquilo é mesmo cama, televisão e roupa lavada!”; “olha o anel de ouro! Então, não é o gajo corrupto?”; “olha a pinta do bicho! Está com bom aspecto agora, faz-lhe bem a “choldra”!”

Nada disto, deixemos a dignidade para depois, agora o que importa é impressionar: quem é que com tanto dinheiro necessita de vestir t-shirts rotas ou botas usadas? O Homem é inocente!

Foi a pensar nisto tudo que expus (atendendo ao “reforço vicariante”) que optei por apresentar-me como me apresentei. O meu Leitor(a) avaliará!

E as questões? O tão receado “contraditório”?

Quando fui abordado pela CMTV pediram a acusação e despachos da Relação.

O que fiz? Neguei estrategicamente a informação? Protegi-me?

Era isso que eu devia ter feito, Caro(a) Leitor(a)?

Vejo que cometi novo erro: facultei tudo o que me solicitaram! Eu sei, eu sei, ou melhor, eu senti na pele as consequências do meu acto!

Fui bombardeado com questões delicadas para a minha imagem, ainda que pertinentes porque servem a Verdade!

As questões foram formuladas sustentando-se na convicção da acusação, o que implica partir-se do pressuposto que eu pratiquei todos os crimes de que estou acusado.

Nesse momento compreendi os ataques de raiva do José Sócrates, o facto de este não responder a nada do que lhe perguntam, nesse momento desejei interpor medida cautelar contra o grupo Cofina.

Mas depois pensei: isto é a “Verdade”, aquilo que a Acusação crê ser a “Verdade”, e, por mais incómoda que seja, tem de ser conhecida, discutida, analisada.

Mais, esta é a “Verdade” do sistema, a forma como é entendido o instituto da prisão preventiva, a forma errada. Eu, enquanto profissional da P.J., com 15 anos de Serviço, tenho a obrigação Ética e Moral de denunciar e discutir a temática, não só abordando de forma auto-centrada o meu caso, mas extrapolando para os exemplos que conheço e censuro.

“Humildade não é pensar menos de si, é pensar menos em si”, e isto faz toda a diferença entre epitetarmos a “Verdade” do Outro de “canalhice”, ou, com garra, rigor, honestidade intelectual, com coragem, rebater o argumentário contrário.

Dia 14 de Dezembro de 2015, José Sócrates vai dar a sua primeira grande entrevista na TVI!

Não espero nada de novo e divertir-me-ei dentro do meu “jazigo”, pois o José vai seguir o “guião” do assessor de imagem. Saberá quando franzir o sobrolho porque antecipadamente sabe que a 14ª questão será sobre o Juiz Carlos Alexandre, a 25ª questão sobre o João Perna, a 30ª sobre o Santos Silva.

É uma entrevista estrategicamente desenhada com aquela que é a sua “Verdade”.

Quanto ao sistema, à Justiça, aos outros que ainda por cá estão e aos outros que podem vir a estar, Sócrates é omisso. Por desinteresse, por ignorância, por um terrível sentimento de culpa, uma vez que é um dos responsáveis pelo “estado da arte” da Justiça em Portugal, o José será omisso!

Sócrates terá palavras-chave, momentos e mensagens estrategicamente preparadas, nada daquilo é espontâneo, verosímil.

Ricci Bitti e Bruna Zani, na sua obra, “A comunicação como Processo Social”, dizem-nos que “a convicção do Tribunal é formada dialecticamente para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im)parcialidade, serenidade, “olhares de suplica” para alguns dos presentes, “linguagem silenciosa e do comportamento”! Ora, isto tudo é verdade se existir contraditório, liberdade jornalística e pessoal.

Nem José Sócrates, nem João de Sousa, estão a ser avaliados pelo Tribunal que há-de julgar ambos (pelo menos no meu caso, no dele ainda não há acusação) quando são entrevistados, mas existe outro Tribunal: o da opinião pública!

E ambos, com a devida proporção, têm responsabilidades na área da Justiça, ambos, por imperativo Moral e Ético, devem contribuir para o esclarecimento do sistema de Justiça português. É minha profunda convicção, baseado no que vivi aqui com o “recluso 44” que este só vai baralhar mais, tornar a água mais turva, porque lucra à sua causa esse efeito.

É só o Sócrates? Claro que não! Vejam as entrevistas dos candidatos à Presidência da República!

Na psicologia estuda-se o “efeito de primazia” e o “efeito de recência”. O que são?

O “efeito de primazia”, na formação de impressões sobre outra pessoa, é a tendência para dar mais importância aos atributos notados no início do que aos notados mais tarde.

O “efeito de recência” é o contrário do anterior, estando ambos relacionados com a recordação livre.

Marcelo Rebelo de Sousa responde às questões sobre a relação com Ricardo Salgado no final da entrevista, apostando no “efeito de recência”; Maria de Belém abre a entrevista com uma declaração afirmando que considera censurável Marcelo Rebelo de Sousa utilizar a universidade, um espaço público, como local de entrevista, apostando no “efeito de primazia”!

Perguntam-me em que “efeito” apostei eu?

Eu levei uma tareia, eu limitei-me a sobreviver à entrevista!

Mas, e eu não controlo a versão final da hora e meia de entrevista realizada, logo não sei o que vai “para o ar”, espontaneamente falei sobre:

– O instituto da prisão preventiva e os meus inacreditáveis 21 meses de prisão, comparado com outros casos;

– O José Sócrates e a sua falência ético-moral;

– O Ricardo Salgado, o António Figueiredo (vistos Gold) e outros notáveis presumíveis inocentes;

– Os pedófilos e a ausência de reinserção e ressocialização social;

– O Juiz Carlos Alexandre e a sua notória infalibilidade;

– A forma como nós (P.J.), Ministério Público e Juízes tratamos os factos que condicionam a decisão de prender ou não prender;

– As condições do Estabelecimento Prisional de Évora que serve comida confeccionada num contentor onde há pouco tempo foram retirar uma ratazana morta da água das azeitonas, apelando à ASAE para fiscalizar isto por aqui;

– O meu castigo de 6 dias, 22 horas por dia fechado, por delito de opinião;

– Este blogue e a petição civil que corre na “net” em meu nome;

– A minha Família.

Como referi, não possuo o Poder (nem o desejava exercer se o possuísse porque condeno a acção) de exigir a versão final da entrevista controlada. Os “cortes” e montagem final são da responsabilidade da CMTV. Confesso que tenho receio de ser somente olhado mas não visto, é uma incerteza que aceito porque é mais importante viver numa sociedade livre na qual a minha mensagem pode ser ouvida hoje, amanhã ou mesmo depois, ainda que não entendida da forma que desejo.

A CMTV garantiu-me que a entrevista fará parte de um programa onde o painel de comentadores vai analisar o conteúdo das minhas palavras.

Garantiram também, caso desejasse, a presença do meu advogado.

É justo e será útil à minha causa, consiga eu contactar o meu defensor que não atende o telefone, nem aparece por aqui, por forma a desenhar a estratégia da minha defesa. Eu compreendo, não disponho da capacidade económica para garantir a exclusividade de um defensor, e isto também é o “sistema”. Não existe igualdade na defesa para todos os portugueses, e, o meu defensor, conquanto eu consiga “sacar” estas entrevistas, apesar de ter conseguido não cair na “rua do esquecimento”, possivelmente é averso à exposição pública!

E não creia o meu Estimado(a) Leitor(a) que o parágrafo anterior é uma mensagem para o meu defensor, porque, acredite ou não, cerca de 190 000 pessoas já passaram por este blogue, não se contando o meu advogado entre as mesmas, ele que sempre me disse que um dia leria o que aqui se escreve!

“Acusado de violação do segredo de Estado, acesso ilegítimo a dados pessoais, abuso de poder e corrupção, Jorge Silva Carvalho (Ex-Director-geral do SIED) abriu o livro quando foi confrontado pela Juíza”; “Nota medíocre para doze magistrados”; “Ex-Director do SEF acusado de favorecer ex-sócio de Miguel Macedo”; “Caso Sócrates: entregas de dinheiro acompanhadas em directo”; “Rangel devolve bens a Sobrinho”; “Ricardo Salgado em liberdade”; “4 menores abusados por dia”.

Tudo títulos nos jornais, tudo falado directa ou indirectamente durante a minha entrevista. Abordado de forma espontânea, crua, frontal, corajosa, sem tácticas ou subterfúgios; mas nunca esquecendo, porque sinto na pele, que todos estes são notáveis presumíveis inocentes que em liberdade exercem o seu inegável direito à defesa do seu bom nome e inocência, seja recorrendo a artimanhas ou condicionamento da imprensa, seja através do silêncio e ocultação das suas acções; e eu, o Inspector João de Sousa da Polícia Judiciária, possivelmente não a melhor cerveja do mundo, mas o mais ardiloso criminoso desde Alves dos Reis, o mais execrável desde Barrabás, o mais perigoso desde Hannibal Lecter, preso preventivamente, sem julgamento, há 1 ano e 9 meses (há dois Natais, há um nascimento de um “filho-homem”, há dois aniversários das “filhas-princesas”, há 62 textos neste blogue …).

Fico à espera do comentário do meu Leitor(a) à entrevista. Informarei neste espaço a data e hora da transmissão na CMTV. Disseram-me que será num sábado deste mês.

Diga-me qualquer coisa, Estimado(a) Leitor(a), preciso de uma opinião sincera, porque a da minha mãe e de quem me conhece bem, eu sei perfeitamente qual será!

(*) João de Sousa é ex-inspector da policia judiciária em prisão preventiva no Estabelecimento Prisional de Évora

Publicado originalmente no blog Dos dois lados das grades da autoria de João de Sousa

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