Ao longo da minha existência andei à deriva como tantas caravelas. A descobrir caminhos nunca dantes navegados. Sem saber se o que sabia me servia, se era luz, se sombra, se era conhecimento, ignorância ou apenas fruto da minha época.
Hoje fui parar a uma das viagens mais bonitas que fiz na vida, a Garden Route na África do Sul e inevitavelmente liguei-a ao mundo e às novas formas de comunicarmos e aprendermos.
O mundo sempre andou à deriva. Imaginem uma Caravela saída do Cais Rocha Conde D`Óbidos com destino à longínqua e desconhecida Índia. Os marinheiros dessa caravela descobriram as ilhas que formam Cabo-Verde, a Costa Ocidental africana, até avistarem o Cabo, na linha por onde ninguém passava.
O Velho do Restelo sentado fazia de Neptuno. Atirava tempestades, revolvia os dois oceanos e cobrava-lhes as vidas. Não havia forma de comunicarem quando ir ou como ir, menos ainda blogues de viagens.
A História vive de períodos de contracção e períodos de dilatação. Luz e sombra. De caravelas e descobertas. E Velhos do Restelo vestidos de Neptuno e agindo como o Deus da Água – “Estes caminhos não são para ti, são inavegáveis. Ides desconseguir” dizem-nos.
A História vive de caminhos marítimos por navegar onde os corpos dos espíritos aventureiros jazem nas profundezas do mar, esquecidos pelo tempo.
A comunicação do saber, da ignorância, do conhecimento e do desconhecimento vive também em árvores milenares que serviam de posto de correio, onde se depositavam as notícias das descobertas de novos mundos a quem por ali passasse. A rede de comunicação comum nascia.
Desses caminhos descobertos, abertos a catana, abertos a sangue e vidas, chegamos a oásis com baleias, leões-marinhos, pinguins, ouro, canela e marfim.
De carroças puxadas a cavalo chegamos à Belle Époque sucedida por uma guerra de proporções inimagináveis. O Renascimento e o Iluminismo seguiram-se à Idade Média – das Trevas – transição para a era moderna. Fazem-se grandes invenções da ciência e da tecnologia, passando por duas Guerras mundiais e outras tantas semeaduras de corpos.
Saindo da cidade do Cabo- onde poderia facilmente passar o resto da minha vida – fiz a Garden Route – a rota de um jardim, onde todos os lugares são cenários idílicos, onde a vida podia parar – Nessa altura não havia formas de mostrar o que via nem o que sentia. Como um marinheiro.
Chegada a Mossel Bay tinha uma surpresa. Esperava-me a maior e mais bela árvore que já vi. Património da Região. Debaixo da imensidão de ramos, uma estátua de Bartolomeu Dias rendia-lhe homenagem pela conquista dos maus ventos que sopravam na linha que separava os oceanos.
Ali foi estabelecido, debaixo daquela árvore – dentro de uma bota- que marinheiros em passagem deixariam as suas mensagens sobre o que descobriam, viam, traziam, pensavam, desses mares e terras desconhecidas.
Estabeleceu-se a primeira rede de comunicação entre barcos, naquela rota finalmente desbravada. Nascia uma rede social.
No meu tempo de vida quem me diria que eu iria estudar um curso superior à distância? Que iria conhecer navegadores que desbravavam um caminho inseguro e desconhecido que era estudar dessa forma? Que sem nos conhecermos iríamos partilhar a vida, conhecimento, opiniões, alegrias e tristezas?
Quem me diria que eu me iria comunicar com as minhas tribUs sem ser andando a galope num cavalo, ou caminhando centenas de quilómetros como um guerreiro Masai?
Quem me diria que iria ler e escrever “online” para um site, blogues e pequeninos jornais de província?
E, não podendo andar a pé pelo mundo a conversar e a transmitir,ia poder oferecer o que sei, vi, sinto e conheço colocando-o online para quem quisesse usufruir?
Naturalmente que os tempos oferecem o seu contrário- a sombra. O horror, o pânico, a dependência, a escravatura. Verdade! Tens razão Neptuno seu Velho do Restelo. Tinhas que nos atirar umas tempestades e uns ventos cruzados para vermos de novo a incongruência, a tirania, a maldade de que somos feitos e a ignorância que nos molda.
Somos os padres que matam, somos os reis que exploram, manipulam e aniquilam para que o conhecimento não circule, e, possamos morrer na ignorância, comidos pela selvajaria que habita a nossa natureza.
Pois bem! Mas nós somos – também – os marinheiros nas caravelas rudimentares. Somos os viajantes da Companhia das Índias Orientais, sujos, abandonados à sorte, prostitutos, vendidos, loucos e os cheios de sonhos.
Somos os pioneiros, somos os peregrinos, somos os pintores das cavernas, somos Da Vinci, somos Voltaire e Rousseau, somos Van Gogh, somos as bruxas mortas nas fogueiras por saberem demais.
Somos Joanas com arcos de visões. Somos os que morrem sem contar as descobertas, as mentiras e as verdades. Somos os que vivem para contar e pintar. Somos os que esculpimos a vida.
Somos aqueles que comunicam o conhecimento aos outros. Somos os que não deixam que os Sistemas Educativos interfiram na Educação.
Só através da Educação chegaremos a Mossel Bay, seja lá onde for. A educação é uma estrada que mostra o jardim da Garden Route.
Diria Neptuno que as redes de comunicação são fonte de mentiras, de maldade, ódios e ignorância. E são fonte de conhecimento e bem ser. Ainda bem que as vi nascer e nelas participo oferecendo-me. Colhendo o trigo. Apagando o joio. Escolhendo a rota de Bartolomeu Dias. Escolhendo um certo caminho para uso.
Atravessamos tempos distópicos. Basta ler, parar para se educar, olhar à volta. Sim, já sabemos disso tudo. São tempos de Sombra mas também de Luz. De cegos e de iluminados. O movimento da deriva constante do mundo.
De descobertas permanentes. Mudanças constantes. Da sombra se fará luz. E a luz saberá rasgar a sombra, como sempre fez no movimento perpétuo do mundo.
Fica onde estás. Não te mexas. O mundo vai mudar na mesma. Em derivas, em luz, em sombra, em descobertas, em afogamentos, em novos mundos.
Serás sempre obrigado a mudar com ele, mas com o conhecimento que vais adquirindo, aprenderás a saber navegar cada diz melhor, até chegares a Mossel Bay, e, depositares uma carta debaixo da imensa árvore – abrigo de tanto conhecimento – com o teu saber. Esse será o meu legado e de tantos navegadores.
Nunca ninguém fez nada seguindo o conselho dos outros, por isso mesmo deixo aqui a mensagem que lá deixei: aprende tudo o que puderes. A fonte é inesgotável.
Incluindo nas redes. Aprendo com tanta gente nas redes e isso é uma conquista que não quero perder. Uma das minhas árvores que só beneficia a minha educação.
Esta é a luz que eu vi nascer, tomei-lhe o pulso e vivo com ela.
É como dobrar o Cabo. À bolina.
Este é o meu trabalho e vai continuar a ser enquanto viver. Agradeço profundamente a quem o acompanha e me lê aqui debaixo desta árvore. Saravá de bom ano.
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