Há uns anos passou pelas televisões europeias, incluindo a portuguesa, uma excelente série italiana intitulada “O Polvo” (“La Piovra”), que retratava com especial fidelidade a actuação da máfia siciliana e a rede de influências por ela tecida e estendida praticamente a toda a sociedade, dos grandes interesses financeiros aos dirigentes de partidos políticos, passando pelas mais diversas instituições públicas, Justiça e Polícias incluídas. Seguramente não por acaso, é esse título de “O Polvo” que me volta agora e repetidamente à memória perante não só o desfiar de acontecimentos das últimas semanas como também face ao desenvolvimento de toda a sorte de manobras de falsidade, de camuflagem, de contra-informação e de manipulação da opinião pública que estão neste momento em curso.
Tudo isto sempre com ar de aparente respeitabilidade e até de indignação de alguns dos principais implicados e, simultaneamente, com o cada vez mais preocupante esquecimento dos basilares princípios próprios de uma sociedade democrática e de um verdadeiro Estado de Direito e, perante a ausência de alternativas correctas e coerentes, com o consequente aproveitamento e o cavalgar das situações pelos mais descarados oportunistas e populistas. O que nos deve obrigar a todos a um esforço redobrado de exigência, de rigor e de transparência, mas também de firme apego aos princípios, sob pena de apenas conseguirmos ver o mais aparente e superficial, e aquilo que é verdadeiramente essencial ficar afinal na mesma.
Assim, depois da pantomina da astronómica e fraudulenta indemnização paga à ex-administradora da TAP Alexandra Reis, e também porque o segredo que sobre ela foi tentado criar, foi, felizmente, quebrado, ficou enfim a saber-se e a compreender-se o seguinte:
1º Pelo menos dois dos membros do Governo (Ministro Pedro Nuno Santos e Secretário de Estado Hugo Santos Mendes), que, aparentemente nada sabiam, afinal sabiam de tudo e até concordaram e autorizaram expressamente o pagamento dos 500.000€;
2º Ao longo da história recente da TAP, já houve pagamentos de outras “compensações” ou indemnizações de valor exorbitante (desde logo a de 1,2 milhões de euros, acordados em 2017 e pagos em 2020 à ex-directora e ex-administradora Maria Teresa Silva Lopes), mas há, obviamente, mais casos destes (ciosamente escondidos da generalidade dos trabalhadores e de toda a comunidade pelas famigeradas “cláusulas de confidencialidade”), tais como o do ex-administrador e ex-director Abílio Martins e o do ex-Director de Recursos Humanos Pedro Ramos;
3º É arrepiante a inacção e a complacência, para não dizer cumplicidade, das diversas autoridades competentes (das reguladoras e fiscalizadoras às judiciárias) perante todos os indícios e até as denúncias das várias ilegalidades praticadas ao longo do tempo na e pela TAP;
4º Afinal, pelo menos a “diligente” CEO da TAP,Christine Ourmières Widener, tem garantido pelo Governo, no final do respectivo mandato, e supostamente se atingir os objectivos (que ninguém sabe quais são) do “Plano de reestruturação” da TAP (que ninguém conhece, a não ser a administração e o governo), um “prémio de desempenho” num valor até aqui mantido religiosamente em segredo, mas que se crê que ultrapassará o milhão de euros, e que permitirá explicar, pelo menos em parte, a sua manutenção em funções mesmo após toda a sucessão de mentiras e actos de má gestão que já praticou e em que, felizmente e não obstante todo o segredo praticado naquela empresa, foi apanhada;
5º A intenção, agora já claramente confessada, do Executivo de António Costa é a de privatizar o mais depressa possível a TAP a preço de saldo e sacrificando seja quem e o que porventura for, inclusive com a destruição do papel estratégico da Companhia e do “hub” de Lisboa em detrimento do de Madrid.
Por outro lado, depois de, com o maior dos descaramentos, as hostes apoiantes de Medina tudo terem feito para culpabilizar e “queimar” apenas Pedro Nuno Santos (insistindo na tese da suposta “inocência” da tutela das Finanças), eis que – com, não o ignoremos também, o evidente gáudio e apoio das forças de direita e a participação activa da Comunicação Social “amiga” das eufemisticamente chamadas “fontes próximas dos processos” – intensificou-se o “tiro ao alvo” na Câmara de Lisboa, com a denúncia de contratos da Câmara celebrados (no tempo em que o seu Presidente era precisamente Medina…) sem concurso ou sequer consultas ao mercado, favorecendo alegadamente pessoas do PS, e com buscas consecutivas da Polícia Judiciária nas respectivas instalações. Tudo isto a par das notícias de acções policiais similares noutras câmaras municipais do país, ao mesmo tempo que, embora se tratando de processos em segredo de Justiça, logo as habituais e sempre cirúrgicas violações do mesmo segredo vão, na velha técnica da “queima em lume brando”, revelando sucessivamente partes incriminadoras dos respectivos autos, incluindo até o suposto teor de escutas telefónicas.
Sucedeu ainda, sem que lamentavelmente nada disto parecesse incomodar ou preocupar fosse quem fosse a não ser os directamente visados, que o Advogado de um dos arguidos detidos (o Presidente da Câmara de Espinho) fez publicamente uma denúncia de enormíssima gravidade: no Tribunal de Instrução Criminal do Porto estará instituído um “sistema”, completamente ilegal, de atribuição do 1º interrogatório dos arguidos detidos sempre ao mesmo Juízo, com escalas pré-definidas e, logo, pré-conhecidas,de qual o juiz de instrução que está de serviço em cada um dos dias de semana. A confirmar-se, isto faz com que o Ministério Público possa antecipadamente conhecer quem vai estar de serviço em cada dia e assim efectuar as detenções no momento que lhe convém para ter o juiz “A” ou “B” a presidir a tal interrogatório e a aplicar as medidas de coacção aos arguidos, tudo isto numa flagrantíssima e de todo inadmissível violação do chamado princípio do juiz natural.
E, naturalmente, não é por não gostarmos ou até divergirmos fortemente dos suspeitos em causa que podemos aceitar este tipo de métodos e de práticas, que se filiam na velha máxima de que os fins justificam os meios,mas que nada têm que ver com uma sociedade democrática e nos põem a todos em risco.
Com tudo isto, em vez de uma investigação séria, realmente isenta e levada até às últimas consequências, desde logo quanto à TAP e quanto a TODOS aqueles, sem excepção alguma, que, ao longo de anos sucessivos, fizeram dela um lucrativo negócio para os seus próprios bolsos e os dos seus amigos, o que temos hoje é uma verdadeira pirotecnia de sucessivos “casos” e“revelações”, mas que, em larga medida, visam sacudir a água do seu capote para o do vizinho e impedir a descoberta integral da verdade.
Recorde-se que quando o escândalo da indemnização de Alexandra Reis atingiu tal dimensão que não mais foipossível abafá-lo, António Costa e Fernando Medina apressaram-se a invocar, como que em sua defesa, que já tinham remetido a questão para averiguações quer da Inspecção-Geral de Finanças (IGF), quer da Procuradoria-Geral da República, e que assim estaria tudo bem…
Só que, por um lado, ninguém percebeu de quanto tempo precisa afinal a IGF para esclarecer o que efectivamente se passou com a ilegal “renúncia negociada e remunerada”de Alexandra Reis e, por outro, depois dos sempre tardios e sempre repetidos arquivamentos do Ministério Público em casos tão escandalosos como os da ruinosa compra da VEM pela TAP, do martelado processo de privatização desta, da dolosa destruição dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, ou dos contratos de “swap” de empresas públicas como o Metro de Lisboa, pouco ou mesmo nada haverá a esperar, muito menos de forma eficaz e em tempo útil, de tais investigações. Aliás, quanto às do Ministério Público, foram logo significativamente colocadas num não justificado “segredo de Justiça”, para que ninguém pudesse controlar e fiscalizar o que nelas anda, ou não, o mesmo Ministério Público a fazer…
De seguida, o Tribunal de Contas (TC) anunciou (em 17/1) que também iria investigar e auditar aquilo que se passara com a indemnização de Alexandra Reis, o que, a avaliar por anteriores auditorias (desde a que pôs a nu os artifícios de Marta Temido, quando era Presidente da ACSS, para manipular as estatísticas da Saúde, e a que denunciou o carácter desastroso para o Estado da forma como foi operada a “renacionalização” da TAP, com o mesmo Estado a possuir a maioria do capital mas os privados a mandarem na Companhia) poderia fazer esperar por bons resultados. Mas, quando se soube que oPresidente do Tribunal, José Tavares, iria a uma audição parlamentar e muito provavelmente lhe seria colocada a questão da TAP, logo sucedeu (mais) uma coisa assaz interessante: apareceu plantada nos jornais a notícia de que 74% dos contratos celebrados por aquele Tribunal desde 2008 tinham sido por ajuste directo, numa subtil mas evidentíssima manobra de antecipação e de prévia descredibilização das conclusões a que tal auditoria do TC sobre a TAP possa entretanto chegar. E, claro, a Comissão Executiva logo anunciou que irá encomendar uma auditoria externa, não se sabendo a que entidade e para auditar o quê, mas sendo fácil de prever que a mesmapossa vir a concluir pelo rigor e diligência desta Administração e que, se falhas graves houve, elas se deveram à actuação de outros que não os actuais gestores…
Por estes dias, Madame Christine vai também anunciar, com toda a pompa e circunstância e com a prestimosa ajuda do Governo, das agências de comunicação e dos jornalistas e comentadores “amigos”, que a sua “competentíssima” Administração conseguiu que a TAP tivesse lucros em 2022, provavelmente da ordem dos 140 milhões de euros, sendo “o melhor resultado de sempre” da Empresa. Mas esquecendo “convenientemente” que só com o corte de salários e demais prestações remuneratórias da generalidade dos trabalhadores “poupou” 250 milhões, e que – por erros de gestão e em especial por falta de trabalhadores (foram 2.400 mandados para o desemprego entre 2020 e 2021!), em particular pilotos, tripulantes de cabine e técnicos de manutenção –desperdiçou a possibilidade da adequada retoma da actividade, tendo, ao invés da maioria das companhias de aviação, transportado em 2022 menos 20% dos passageiros que em 2019, o que só por si destrói a falácia dos resultados e dos lucros com que Madame Christine irá tentar engalanar-se e Costa e Galamba procurarão decerto justificar a manutenção em funções de quem há muito deveria ter sido despedido.
É, pois, por elementares razões de transparência e de controlo dos dinheiros públicos, mas também por tudo o que já se soube e por aquilo de que há já indícios mais que bastantes, que todos os aspectos da gestão da TAP, pelo menos dos últimos 10 anos, não podem deixar de ser investigados e esclarecidos até ao fim, sem opacidades, sem cláusulas de “confidencialidade” ou de “lei da rolha”, sem manobras publicitárias e sem operações de manipulação e de intoxicação da opinião pública.
Entre os aspectos a averiguar integralmente, não podem deixar de se referir os seguintes:
– os contratos de leasing dos aviões com preços 20 a 30% acima dos preços de mercado;
– os contratos de aluguer de tripulações e aeronaves, bem como os de manutenção e de substituição de motores, a preços manifestamente excessivos, mas aceites devido à falta de meios disponíveis na empresa;
– a entrega a uma empresa não certificada da transformação em cargueiros de 2 aviões A-330 e a sua consequente e prolongada paralisação;
– os custos (designadamente em indemnizações a passageiros) dos voos cancelados devido a falta de tripulantes ou de técnicos de manutenção;
– os encargos financeiros totais para a Companhia decorrentes das contratações de directores e gestores, ditos “de topo”, da confiança da Administração (e incluindo nãoapenas o vencimento-base mas TODAS as prestações pecuniárias pagas, tais como os abonos de chefia, os subsídios de residência, de realocação ou de educação dos filhos, as isenções de horário, os “diferenciais de remuneração”, os seguros, etc., etc., etc.), e também de Sociedades de Advogados (como a SRS-Legal, de Pedro Rebelo de Sousa, e a ML – Morais Leitão), de consultores (como Guilherme Dray), de consultoras (como a BCG), eainda de empresas prestadoras de serviços (de informática, de fornecimento de mão-de-obra, etc.);
– a forma como foi preparada e tentada a mudança das instalações para o Parque das Nações;
– o cabal esclarecimento das ligações (pessoais, profissionais, políticas, económicas ou outras) existentes entre os autores, morais ou materiais, de todas estas decisões e as contra-partes e/ou os delas efectivos beneficiários.
Sem esta investigação séria e aturada, nada de verdadeiramente relevante se apurará e todo o fogo-de-artifício que actualmente se faz sentir não passará de mera chicana. E para aqueles que ainda não conseguem ou não querem vislumbrar o ponto onde se chegará acaso a verdade não seja mesmo investigada e as responsabilidades cíveis, disciplinares, criminais, políticas e éticas apuradas até ao fim, vejam-se algumas realidades, que mostram bem aquilo em que a TAP tem vindo a ser transformada e a forma como prudentes se transformam em completos imprudentes e detentores dos mais variados poderes se assumem como autênticos vilões.
Assim, se em Março de 2022 advogados da Morais Leitão representaram Alexandra Reis perante a TAP na negociação da respectiva indemnização e em Julho do mesmo ano defenderam trabalhadores da TAP em processos judiciais, a partir de Janeiro de 2023, senão mesmo antes, passaram a representar a parte contrária (a mesma TAP), nomeadamente em processos disciplinares movidos pela Empresa contra trabalhadores, quando, em Julho de 2021, um desses advogados interveio como árbitro da Parte Empregadora na Arbitragem para a determinação de serviços mínimos na greve da Groundforce.
Pelo meio, a TAP contratou, em Outubro de 2022 (embora formalmente com data de Dezembro), uma nova “Legal Director”, Manuela Vasconcelos Simões, ex-Tranquilidade. O ponto curioso aqui é que esta é casada com João Tiago Silveira, advogado, sócio e coordenador do Departamento de Direito Público da Morais Leitão, eesta sociedade de advogados passou entretanto a assegurar… parte do Contencioso da TAP! Por outro lado, Guilherme Dray, ex-chefe de gabinete de Sócrates e braço direito de Costa e de Pedro Nuno Santos, interveniente em várias reuniões como assessor do Ministério das Infraestruturas, aparece em 20/1/2023 numa sessão doTribunal Arbitral que definiu os serviços mínimos da (entretanto desconvocada) greve dos tripulantes de cabine, a prestar esclarecimentos como representante… da TAP!
Por outro lado, e tal como foi denunciado pelo Sindicato dos Pilotos e publicamente noticiado, no final do ano passado, num absolutamente sobrelotado voo da TAP de Lisboa para o Rio de Janeiro, por ordem de um dos membros da Comissão Executiva (segundo foi referido,Silvia Mosquera, ex-Iberia) foi recusado o embarque a dois passageiros com bilhetes válidos, em troca de uma indemnização de 1.050€ a cada um, simplesmente para que em tal voo pudessem embarcar dois conhecidos daquela administradora do sector da aviação (Pietro Cassita, da companhia espanhola Volotea e Jose Luis Ortega Iglesias, da Iberia), portadores dos chamados bilhetes “staff” (gratuitos). Ora, de acordo com os regulamentos, tais pessoas só poderiam embarcar se houvesse lugares de passageiros vagos no avião ou, e apenas com expressa autorização do Comandante, se houvesse lugares de serviço da tripulação (“jump seats”) disponíveis, nunca por nunca podendo implicar o desembarque de passageiros com bilhetes válidos. Mas a concepção da Empresa como uma espécie de quinta própria, a lógica do permanente abuso do poder e a sensação da completa impunidade por mais desmandos que se cometam levam a que coisas destas possam suceder e que, uma vez mais, tudo seja encoberto ou, quando posto a nu, seja apresentado como “normal” ou “secundário” e rigorosamente nada aconteça aos respectivos responsáveis.
A realização de uma verdadeira auditoria, com reais poderes investigatórios, à gestão da TAP constitui, pois, uma exigência cívica básica e a única forma de evitar que escape impune, e rico, quem se utilizou da Companhia para, à custa de quem nela trabalha e de quem paga impostos em Portugal, encher os bolsos e alcançar “reformas douradas”!
António Garcia Pereira
[…] 26/01/2023 – TAP: “O polvo” […]
Em 34 anos de TAP, uma simples colaboradora como eu percebeu o que se passava na Empresa. Era tudo segredo mas tudo se sabia. Ao longo de 3 décadas foram preparando o terreno para este fim. Começou tudo por querem dividir a TAP e só correu mal porque quiseram vender a manutenção. Demorou mas finalmente conseguiram roubar-nos a todos. A minha pergunta é:
Depois de casa roubada trancas na porta?
Só depois de tudo destruido ou quase tudo é que todos resolvem falar, porquê??
The Portuguese government, ministers,&
Public companies administrators, have for
Years, lining their own pockets,families &
Friends, with public MONEY!
Tap, has been for years, THE one of the
fat cow’s , they have been milking.
Corruption at the highest level, is a virus
Well installed here.
The European Union, would do well, by
Sending IN a team of fraud squad officers
And investigate all of them.
PORTUGUESE POLITICIANS, ARE SIMPLY
NOT TRUSTWORTHY !!!