Decorria o trágico ano de 2011 quando assisti a um momento que me fez mudar radicalmente a forma de encarar o futuro. Vi um senhor chegar ao Palácio Nacional da Ajuda numa modesta lambreta e sair num pouco modesto carro do estado decidi que a partir desse momento, fosse eu onde fosse, só andava de lambreta. Sempre ouvi dizer “tem cuidado, não acontece só aos outros”, decidi então pôr-me a jeito. Podia ser que um dia estivessem a distribuir carros do estado, calhasse eu por lá passar e… Pimba, entra de lambreta sai de carro.
Finalmente a boa nova chegou pela voz do secretário de estado dos assuntos fiscais, Paulo Núncio. Vou ter carro do estado! Para tal basta a cada passo que der pedir factura com o meu NIF, seja o que for pedir factura é fundamental. Diz o secretário de estado que é para acabar com a fraude fiscal, diz que serve para acabar com a economia paralela. Por exemplo, uma pessoa está apertada, passa num urinol público e ao dar a moeda ao funcionário que está à porta pede factura com o NIF e descrição do serviço.
Vai ser giro, vai ser muito giro. Já estou a imaginar as Tias da Linha após comprarem a carteira Louis Vuitton na boutique do Lelo da Purificação a pedirem factura para ver se ganham o popó.
Não?
Então porquê?
Não me digam, o Lelo da Purificação continua a não passar factura?
Ah ok, não entra nestas coisas da economia paralela. Estranho mas os senhores do governo lá sabem. Desde que a factura do público xixi conte já não é nada mau. Quando o tempo começar a aquecer vou voltar a beber umas cervejas fresquinhas, atendendo ao efeito diurético que a cerveja tem em mim (uma cerveja, dois xixis), pedindo facturas separadas por cada acto é jackpot pela certa.
Pensando bem, não me agrada nada a ideia do Sr. Paulo Núncio ficar a saber quantas cervejas bebo ou quantos xixis faço. Acho que ainda não é desta que vou ter carro do estado. Dito de outra forma, talvez menos elegante mas mais sentida, bebo quando me apetecer e mijo quando tiver vontade e não tenho de dar contas disso ao estado. Umas décadas atrás era necessário ter uma licença para usar isqueiro, não tarda estes projectos de didatores vão querer passar licença para mijar.
Voltemos à questão da economia paralela e da fraude fiscal. Será que não passa por estas mentes iluminadas corrigir o que tem de ser corrigido em vez de andarem a brincar aos sorteios. Será que não conseguem tratar dos assuntos do Estado de forma séria sem por o Fernando Mendes aos saltos a sortear automóveis? Aos saltos é melhor não, com o peso que ele tem não há chão que aguente. Mencionei o Fernando Mendes porque está no canal público de televisão, mas o mais certo é contratarem uma produtora externa, assessorada por uns quantos especialistas e avençarem uns quantos técnicos para realizar a tarefa.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier anunciar que a legislação foi alterada e que as 19 das 20 empresas do PSI20 que mudaram a sede para outro local para fugir aos impostos vão ser obrigadas a voltar a Portugal e a pagar tudo direitinho.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier anunciar que a legislação foi alterada e que o truque das fundações para lavar dinheiro acabou e o lucro é taxado e não desinfectado.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier dizer que quem se “esquece” de declarar oito milhões e meio é seriamente penalizado e que não se safa com um simples “ooppss desculpem lá qualquer coisinha”.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier dizer que os lucros dos bancos são taxados como os comuns mortais e não como divindades.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier dizer que não há mais prémios para gestores públicos incompetentes que só geram prejuízos.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier dizer que não há mais assessores especiais que do alto da sua enorme experiência de vida de 20 anos e 2 de partido são contratados com vencimentos que ultrapassam os três mil euros.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier dizer que o crime não compensa e que os milhares de milhões do BPN foram recuperados do património de quem deles beneficiou.
Quando o Sr. Paulo Núncio vier dizer que se alguém faz uma espécie de permuta duma modesta moradia por uma mansão e não sabe explicar muito bem como nem em que cartório esse bem é perdido a favor do estado.
Quando o Sr. Paulo Núncio disser estas e muitas outras que ainda faltam na lista então posso considerar a hipótese de lhe dar ouvidos e até aplaudir. Antes disso não. Mesmo estando na tradicional época da boa vontade não podemos esquecer que também estamos na época dos circos descerem à cidade o que dispensamos seguramente é este tipo de candidatos a artista circense.
Parem lá com essas brincadeiras, parem lá com essas manobras de distracção e propaganda.
Belo texto esclarecedor a muito burro que, ainal, é burro e embarca nessas tretas.